Para onde vamos ?

Eis o que se nos impõe perguntar a esta sociedade que enveredou por uma competição desenfreada e cega e que nos deixa submersos num mar de dúvidas. Onde nos leva este sistema que proclama o fim das ideologias e cujos dirigentes se escondem por detrás de uma pretensa amoralidade para que mais se realce a valorização dos meios, a eficácia tecnocrata? Sem ideologias, ou pelo menos sem ideários, não estarão os homens a pisar terrenos onde os meios justificam os fins? Conhecemos no passado o Liberalismo e a sua desumanização, a destruição sistemática da Natureza teoricamente apoiada por supostas leis dessa mesma Natureza. Hoje assistimos a um Neoliberalismo que tenta colmatar os estragos ambientais por ele produzidos, mas sem resultados visíveis. E a razão é simples: apoiando-se na economia de mercado, que conduz a uma desigual distribuição e ao desperdíçio, e estimulando a competitividade em lugar da cooperação, do apoio mútuo e da harmonia entre os seres, o Neoliberalismo é estruturalmente anti-ecológico. Não foi a liberal Inglaterra que no passado, motivada pelos altos lucros que retirava da comercialização dos opiácios e sem se importar com a abulia e dependência do povo chinês, se lançou na guerra do Ópio? Hoje , quando assistimos a um concerto de nações para combater a produção e venda de droga, urge perguntar: de que modo? E com que moral? E se a guerra ainda um flagelo maior para a humanidade, porque razão não se juntam os responsáveis para acabar com o fabrico e comercialização de armas? Será que a droga trará menos rendimentos a esses Estados do que o armamento? Utopia pretende ser em primeiro lugar um espaço de reflexão. E reflectir é de certo modo parar, rever o que foi e interrogar sobre o que vai ser. E por isso perguntamos: Para onde vamos? Para onde vamos quando a xenofobia, essa atitude que se consubstancia num "apartheid" - nós e os outros - pretende fundamentar-se nas teses genéticas de alguns sociobiólogos para quem a cultura nada conta? Derrubado o muro de Berlim, parece ter-se desfeito o maniqueismo das duas "democracias" que durante grande parte deste século regeram o mundo e se enfrentaram mais pelo argumento das suas forças que pela força dos argumentos. Mas o triunfalismo das democracias ocidentais parece condenado a prazo. Faltando-lhe a comparação com os autocráticos capitalismos de Estado que se desmoronaram a leste, as democracias ocidentais já só podem olhar para as suas misérias, para o seu autoritarismo consentido, para as suas corrupções e desigualdades sociais. Em política e na falta de argumentos mais convincentes, o que valida um sistema é sempre outro sistema. Procedendo de modo comparativo com outros, se chegará ao menos mau dos estados, ao menos mau dos sistemas políticos. Mas iremos nós contentarmo-nos com isto e ficarmos de braços cruzados, numa atitude fatalista, a olhar a sociedade como se ela fosse a alcateia de Thomas Hobbes e o homem lobo do homem?

A este propósito, Utopia pretende ser mais que uma reflexão. Quando perguntamos para onde vamos, é natural que nos sintamos mal ou insatisfeitos e busquemos alternativas. Por isso, é urgente tentar formas de viver e conviver, procurar outros rumos e o modo de lá chegar.



R.V.C.